quarta-feira, 18 de abril de 2007
Atemporal
de paredes caiadas com
recordações em tons pasteis...
uma esperança que se descasca
com o tempo que passa sem se importar
lembrando que tudo é nada e
que quase nada é muito...
Patrícia Gomes
Imagem: Keren Boguslavski
sexta-feira, 6 de abril de 2007
"Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é"
Há alguns dias eu recebi a proposta de escrever sobre a tal da bipolaridade, e confesso, foi algo que me surpreendeu nesse momento, ainda mais por ser tão forte esse assunto, ainda mais pra mim. Mas enfim, me propus a escrevê-lo e agora estou aqui, tentando descobrir por onde começo a desfiar esse rosário.
Acho que o melhor meio é tentar deixar claro, ao menos tentar, do que se trata.
Até bem pouco tempo era conhecida como psicose maníaco-depressiva, a doença bipolar do humor é caracterizada por períodos de um quadro depressivo, geralmente de intensidade grave, que se alternam com períodos de quadros opostos à depressão, isto é, a pessoa apresenta-se eufórica, com muitas atividades, às vezes fazendo muitas compras ou efetuando gastos financeiros desnecessários e elevados, com sentimento de onipotência, quase sempre acompanhados de insônia e falando muito, mais que seu habitual. Esse quadro é conhecido como mania. Tanto o período de depressão quanto o da mania podem durar semanas, meses ou anos. Geralmente a pessoa com essa doença tem, durante a vida, alguns episódios de mania e outros de depressão. É importante ficar claro que mania, no sentido médico, é diferente de mania para o leigo, significando para estes hábitos que a pessoa sempre repete.
O mais chamativo da doença bipolar do humor são os episódios de mania que podem alternar-se, geralmente ao longo dos anos, com a depressão. Os episódios começam a manifestar-se em geral por volta dos 15 a 25 anos de idade, com muitos casos de mulheres podendo ter início entre os 45 e 50 anos.
A pessoa apresentando o quadro de mania mostra um humor anormal e persistentemente elevado, expansivo, excessivamente eufórico e alegre, às vezes com períodos de irritação e explosões de raiva, contrastando com um período de normalidade, antes de a doença manifestar-se. Além disto, há uma auto-estima grandiosa (com a pessoa sentindo-se poderosa e capaz de tudo), com necessidade reduzida de dormir (a pessoa dorme pouco e sente-se descansada), apresentando-se muito falante, às vezes dizendo coisas incompreensíveis (pela rapidez com que fala), não se fixando a um mesmo assunto ou a uma mesma tarefa a ser feita.
Existem três outras formas através das quais a doença bipolar do humor pode se manifestar, além de episódios bem definidos de mania e depressão.
Uma primeira forma seria a hipomania, em que também ocorre estado de humor elevado e expansivo, eufórico, mas de forma mais suave. Um episódio hipomaníaco, ao contrário da mania, não é suficientemente grave para causar prejuízo no trabalho ou nas relações sociais, nem para exigir a hospitalização da pessoa.
Uma segunda forma de apresentação da doença bipolar do humor seria a ocorrência de episódios mistos, quando em um mesmo dia haveria a alternância entre depressão e mania. Em poucas horas a pessoa pode chorar, ficar triste, sentindo-se sem valor e sem esperança, e no momento seguinte estar eufórica, sentindo-se capaz de tudo, ou irritada, falante e agressiva.
A terceira forma da doença bipolar do humor seria aquela conhecida como transtorno ciclotímico, ou apenas ciclotimia, em que haveria uma alteração crônica e flutuante do humor, marcada por numerosos períodos com sintomas maníacos e numerosos períodos com sintomas depressivos, que se alternariam. Tais sintomas depressivos e maníacos não seriam suficientemente graves nem ocorreriam em quantidade suficiente para se ter certeza de se tratar de depressão e de mania, respectivamente. Seria, portanto, facilmente confundida com o jeito de ser da pessoa, marcada por instabilidade do humor.
Esta é a parte “técnica” do problema, vista por alguém que está fora, na maioria das vezes, do problema. Não é um fardo leve de se carregar, ao contrário. Falo agora por mim, como alguém que foi diagnosticada com esse transtorno. Há um sentimento de culpa quase sempre presente, pois não é algo agradável estar bem e de um segundo para outro sentir-se a pessoa mais vazia do mundo e sem nenhuma causa aparente e mesmo assim com todas possíveis. Ver os que estão ao seu lado sofrerem por não saberem lidar com o problema, ver a inutilidade das tentativas de disfarçar a situação. É horrível ter que ouvir de pessoas que não entendem que tudo depende da gente, que se não quisermos sentir essas coisas basta rezar, levantar, se sacudir. Alguma vez alguém já quis ficar doente pelo prazer de dizer que tem determinada doença? A sensação de se ser um estrangeiro em qualquer lugar é enorme, tanto que, muitas vezes, passamos a ser de nós mesmos.
Sentir-se como mais um estrangeiro num país de muitos, onde ninguém se entende é mais que comum, ainda mais quando se tenta por todos os meios falar algo e parece que jamais vai conseguir chegar a um idioma comum.
Mas há quem diga que há o lado bom, e realmente há alguns episódios em que tudo fica mais claro. Em momentos de mania, onde a insônia quase se faz crônica a produção aumenta, há sempre uma disposição maior pra efetuar pequenas tarefas, como escrever, mas é pior quando a depressão se instala e parece que fomos fatiados em dois e por mais que uma das bandas queira fazer algo a outra não se mexe.
Passar o resto da vida dependente de um remédio que ameniza e te estabiliza é como sentir que está como um pássaro que vive fora da gaiola, mas com uma corrente atada aos pés...
Segurança, confiança, felicidade são conceitos e termos que passam a ser fugazes, pois por mais que a razão (uma das bandas) prove que há e que esteja realmente ao seu lado, há sempre a outra banda revoltosa que não deixa acreditar.
Na verdade parece que somos rodeados por milhões de faces fantasmas que nos perturbam diariamente enlouquecendo-nos ainda mais com questões e conflitos para os quais nunca encontraremos respostas.
Patrícia Gomes em texto e imagem.